O lanterninha tem saudade
É difícil convencer o Carretel a falar sobre a época mais divertida da sua vida. Deve ser porque o Cine Mar, o cinema de Atlântida onde trabalhou como porteiro, lanterninha e gerente de 1958 a 1979, já não existe mais. Desativado em 1979, ficou abandonado até o telhado ruir e ter de ser demolido. Ficou meio doloroso para o Carretel relembrar os anos de ouro do cinema, localizado na Avenida Paraguassu. Mas depois que engata no tranco, ele volta a sentir a felicidade daquele tempo e abre um sorrisão.
- Eu tenho saudade daquela época. Era divertido. Os 600 lugares estavam sempre 80% ocupados. E eu via os jovens namorando - recorda Calino Monteiro Fernandes, o Carretel.
Eram outros tempos. O gerente do cinema, Wilson Dieterich, tinha de levar os filmes aos pedaços, de lambreta. Se tivesse algum problema, os espectadores tinham de esperar até que chegasse o rolo da próxima sequência.
Um dos maiores desafios daqueles dias para Carretel, hoje com 73 anos, era impedir que as diabruras da rapaziada prejudicassem o cinema. Uma turma o incomodava especialmente. Eram os tipos que instalavam uma espécie de palito de cheiro ruim no banheiro. Aos poucos, o budum se espalhava pelo cinema. As vaias tomavam conta. Era um bruto cheiro de cocô.
- Eu tinha que pegar os líderes. Mas, naquela época, a gente tinha medo de tocar nos guris, que eram uns filhinhos de papai - diz.
Carretel armou um plano. Montou um time de futebol com os guris para identificar cada um e dar um jeito de fazê-los abandonar a brincadeira fedorenta. O resultado foi diferente do esperado. O time começou a ganhar e não parou mais. Venceu tudo que era campeonato, e os rapazes deixaram o cinema em paz. Carretel ganhou um aumento de salário.
E o apelido? Quando jovem, Fernandes era um baita corredor. Como batia qualquer um, ficou sem graça competir com ele. Então, criaram uma regra especial: ele ficava deitado na pista, segurando uma fita. Quando os competidores passavam e a rompiam, Fernandes podia levantar e sair atrás dos concorrentes. Por causa da fita, levou o apelido de Carretel.
Com cinco filhos, aposentado desde 2007, Carretel não esbanja velocidade mais, porém, continua cheio de energia. Ainda que more longe da praia, não deixa de ir ao mar. Em vez da pernada até a orla, deve ser um dos poucos banhistas a chegar à areia de bicicleta.
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